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Uma conversa sobre Indie Games (BGS 2015)

domingo, outubro 18, 2015

Ocorreu até o dia 12 de outubro a maior feira de games da América Latina, a Brasil Game Show (BGS). A 8ª edição da convenção trouxe pela segunda vez o pavilhão indie. Diferente de 2014, desta vez a área contou 24 expositores - mais que o dobro do ano passado.

Além de liberar espaço para o mercado brasileiro apresentar o trabalho, a feira organizou o Indie Meeting, onde os expositores da área promoviam palestras e um bate-papo com os visitantes. O problema foi que área Indie ficou muito distante de todo o restante da feira - dando sensação de que foi isolado -, parte considerável do público não visitou o pavilhão (ou sequer sabia da existência).

Mauricio Alegretti (Smyowl) em sua palestra durante o Indie Meeting.

A esperança é que em 2016, com um espaço maior - a próxima edição será na São Paulo Expo, antigo Centro de Exposições Imigrante - a área seja melhor trabalhada, se aproximando mais do resto da feira.

Durante minha visita conversei com alguns dos expositores indies, um diálogo breve, mas interessante:

Há quanto tempo você(s) está(ão) no mercado de games?

Smyowl (Mauricio Alegretti): Cara, na verdade depende muito do ponto de vista, porque desde moleque eu desenvolvo jogos. O primeiro jogo que eu fiz foi mais ou menos com 8 anos de idade nos anos 80, só que assim, na época era praticamente impossível pensar em desenvolver jogos no Brasil, não tinha mercado. Por muito tempo eu fui para o lado de programação normal, fui fazendo aplicativos e tudo mais. Aí em 2005 eu comecei a me interessar a tentar fazer uma mudança profissional para desenvolvimento de jogos. Tenho 2005 como um marco no início da imigração, o segundo marco é em 2010 que é quando fiz a mudança de chave total para desenvolvimento de jogos.

DNAe Studios: Olha, esse é o primeiro projeto (Libertatem) que a gente tá botando no mercado, então é bem recente mesmo.

G2E (Mônica Stein): A gente começou com a pesquisa no final de 2011, tentando imaginar que game poderia ser esse a gente ia construir. Aí de repente, a gente entendeu que não seria melhor a abordagem de trabalhar com games casuais, porque na realidade hoje tu tens uma sessão de 4 mil jogos novos por mês. Daí a gente pensou que talvez para discutir mercado no Brasil, indústria de games, a gente deveria trabalhar com franquia, uma franquia baseada então em cima de uma história forte. A gente começou estruturar então um grande projeto transmídia, e aí sim um jogo, uma trilogia, um rato traficante de açúcar, década de 40. Uma história mais mundo, menos brasileira, muito mais mundo. E isso tu tens uma história forte como são as grandes séries de sucesso de hoje: Breaking Bad, Game of Thrones, House of Cards. Tu consegues estender isso para outros produtos transmídias e trabalhar com outras audiências.

Void (Danilo Pereira): Cara, esse jogo está em produção há dez meses* e em uma equipe de sete de pessoas. A Void é bem nova no mercado, a gente começou agora. E foi muito rápido o que aconteceu, a gente já conseguiu desenvolver para Xbox One, Ps4, vai sair para PC, também. Praticamente foi isso, dez meses que a gente tá produzindo jogos, mas a empresa tem até menos, seis meses. Aconteceu, né? Deu certo, a gente se reuniu em sete pessoas. Começou a produzir o jogo em casa mesmo, skype, um faz concept, outro escreve, outro faz 3D, outro a programação, e deu certo. Graças a Deus o feedback está sendo bem positivo para nós.


Equipe da DNAe Studios, apresentando Libertatem, o seu primeiro jogo.
Qual(is) games o estúdio já produziu?

Smyowl: O Neymar Jr. Quest, que é o que a gente tá lançando hoje (12 de outubro de 2015), é o 14º jogo que a gente desenvolve. O maior jogo que a gente já desenvolveu até hoje é o Button Soccer, não o maior em complexidade, mas em questão de audiência, ele já tem quase 2 milhões de downloads e foi lançado em 2012. A gente tem o ritmo de lançar 3 a 4 jogos por ano, esse ano saiu o nosso primeiro jogo de PC, em maio, que foi o Cave Coaster.
DNAe Studios: O que a gente já lançou é só esse mesmo (Libertatem). A gente tá com planos de voltar a produzir alguns assim que lançarmos esse.

G2E: Nós fizemos no início um jogo na área de ensino de espanhol, línguas, que ficou parado, a gente terminou o primeiro protótipo e aí a gente começou com essa ideia nova e deixou ele parado. A gente tem hoje atualmente um outro projeto de animação que ainda não tem o jogo, a gente tá discutindo a animação no centro, ou seja, o inverso. É a história de uma menininha de 11 anos. Futuramente a gente vai ter outros projetos encubados, o G2E como grupo de pesquisa dentro da  universidade (UFSC) tem outros projetos encubados, só queria deixar claro que a gente trabalha com foco comercial, na ideia do tripé: Universidade, Empresa, Governo.

Void: Não, esse é o primeiro mesmo. Essa é a nossa primeira BGS como expositor, a gente tem outros projetos, mas para o futuro. O foco da gente é terminar o Eternity (a previsão de lançamento é o primeiro semestre de 2016). Jogo de ação, aventura, baseado na mitologia nórdica.


Mônica Stein, da G2E, apresentando o jogo The Rotfather.
Como você definiria o mercado brasileiro de cinco anos para cá?

Smyowl: Evolução, se fosse em uma só palavra. Eu acho que há 5 anos atrás nós tínhamos alguns guerreiros, acho que a gente tem que reconhecer, foi uma geração que lutou muito para a gente estar aqui. Eu peguei um pouco dessa migração de gerações, apesar da empresa ser mais recente (a empresa nasceu em 2012), mas eu também peguei bastante essa época que era quase impossível pensar em jogos. E aí você vê a evolução de, por exemplo, um pavilhão indie como esse da BGS chamando a atenção, gente absolutamente em todas as horas do dia, todos os stands cheios, muita gente inclusive falando que gostou mais do pavilhão indie do que o pavilhão hardcore. Isso para a gente é uma honra muito grande, um orgulho muito grande, ver que que não tem um stand brasileiro vazio. É uma coisa que comentei na palestra, não adianta ter um stand cheio, não adianta tem uma empresa brasileira em destaque, todo mundo tem que se ajudar para todo mundo estourar junto para a gente, de fato, chamar isso de mercado.

DNAe Studios: Teve um salto muito grande, antigamente você ouvia falar muito pouco de jogos indie. E agora tem um boom, mas mesmo crescendo bastante ele ainda continua relativamente pequeno, tem muito ainda a caminhar.

G2E: O mercado brasileiro de games é, assim, muito bem visto pelas empresas que querem vender jogos aqui, mas ainda a nossa indústria de games é muito pequena, praticamente ridículo o que a gente ainda faz perto de outros países. Nós somos realmente muito pequenos, basta ver que ano passado tinham três ou quatro indie games, esse ano a gente tem 21. A gente tá em um momento de crescimento, eu acho que na indústria de jogos, sendo bem sincera, é que falta ainda para nós um olhar business,  entender que o jogo é muito mais que meramente três carinhas juntar e fazer um jogo bacana. Mas pensar que ele precisa vender, que as pessoas para viver de games elas tem que ter alguma coisa que esteja dando certo, senão elas não conseguem pagar as contas delas no final do mês. Então na realidade é bem por esse motivo que a gente está trabalhando nessa linha, não que todos tenham que trabalhar nessa linha, mas é uma linha para tentar mostrar para o governo que essa indústria é viável, não só do ponto de vista games, mas de tudo que ela pode gerar. Quando os outros desenvolvedores de games entenderem que eles têm na mão não só uma coisa que pode ser vendida como game, mas que eles também podem estender isso para outros caminhos eu acredito que daí a gente vai ganhar um olhar um pouco diferente pra tentar entender que a gente não faz joguinho, a gente faz um produto que vende, ou seja, a gente faz negócio.

Void: Cresceu demais. Eu tenho base com conversas que tive com jogadores que vieram aqui ano passado e disseram: "Nossa, eu vim aqui ano passado e tinha quatro standzinhos e agora tem mais de 20!". E é tudo brasileiro, cara. Tem os caras do Rio aqui, parece que veio também gente do Amazonas, Pará, etc. Acho cresceu e tende a crescer mais.

Danilo Pereira, da Void Studios, apresentando o seu jogo Eternity: The Last Unicorn.

O que você acha da oportunidade que a BGS está oferecendo ao mercado indie brasileiro?

Smyowl: Fantástico, eu acho que a BGS tem duas coisas bacanas que são extremamente importantes para o mercado indie. A primeira delas é que a feira traz muitos estrangeiros e a segunda é que tem muita gente vindo para cá e perdendo o preconceito com o jogo brasileiro - eu digo de consumidor brasileiro mesmo -, porque até pouco tempo atrás o pessoal via o jogo brasileiro como um jogo de menor qualidade. E sendo bem honesto até de fato era, quando você via um jogo brasileiro e um jogo estrangeiro era gritante. Hoje em dia, eu acho que a única diferença que existe entre um jogo brasileiro e um jogo estrangeiro não é mais a capacidade da empresa, é só o nível de investimento.

DNAe Studios: Tá muito legal, a gente teve contato com empresas grandes, empresas que a gente nunca conheceria sem a BGS. Fora o contato com o público, que está dando um feedback muito bacana para a gente. Tá sendo muito bom.

G2E: Eu acho que essa oportunidade de mostrar os indie games brasileiros é ótima, eu espero que ano que vem a gente tenha um espaço muito maior, porque a gente sabe que existem muito mais indie games do que esses para poder mostrar que a gente tem talento no negócio, que a gente sabe fazer. Embora eu acho que ainda falta a gente aprender uma porção de coisas, eu só acho que a gente ficou um pouquinho escondido para o lado de cá, eu estava esperando uma participação maior das grandes empresas tentando vir aqui e conhecer os indie games. Até porque estão entrando no mercado brasileiro, estão interessados em mercado brasileiro, eu gostaria de ter visto o pessoal da Xbox aqui, o pessoal da Sony, vendo o que a gente está fazendo. Que a ideia do indie game é mostrar coisas, as vezes, diferente do que já está vendido por aí. Mas ao mesmo tempo acho que a abertura para nós é fantástica, não estamos aqui dois anos atrás, ano passado a gente começou a aparecer, então eu espero que ano que vem a gente esteja em um número muito maior e talvez um pouquinho mais para o lado de lá (stands internacionais).

Void: Sem palavras, a gente tá aqui desde de quinta-feira e só coisas boas. Veio gente muito importante ver o jogo, analisar. A gente pegou muito contato. Uma coisa muito importante, pelo menos para mim que escrevi o jogo, é o feedback do player. Gostaram muito do estilo do jogo. Veio até um cara com mais idade aqui e disse: "Caramba, esse jogo é câmera fixa, né cara? Caramba voltei naquela época, porque acho que nessa época falta isso, né?". A gente quer resgatar um pouquinho da essência daquela época, daquela câmera fixa e tal.

Eternity, da Void Studios.
Na sua opinião, já é possível viver de games no Brasil?

Smyowl: Olha, é difícil, é realmente difícil. Mas sim, já é possível, são poucas as pessoas e poucas as empresas que conseguem viver integral de games, infelizmente.

DNAe Studios: Olha, pelo contato que eu tive são poucas as pessoas que conseguem viver inteiramente de jogos do jeito que elas querem.

G2E: Ainda não, acho que temos algumas empresas que estão bem felizes de estarem dentro da Xbox, dentro da Playstation, mas acho que ainda não é possível viver de games adequadamente. Porque você faz um jogo e aquele jogo vende, será que você vai saber fazer outro que vai vender também? E dentro do perfil  de negócios dessas empresas, elas querem jogos que vendam. E você é mais um lá, acho que ainda falta um pouquinho mais de entendimento do negócio para que a gente possa então realmente viver de games. Acho que estamos no caminho, mas faltam entender algumas coisas um pouco mais.

Void: Com certeza, é possível sim. Você vê que o nível melhorou demais de um tempo para cá. Há cinco, seis anos atrás era só joguinho, assim, bem básico. O pessoal até comentava: "Ah, mais um joguinho brasileiro, não vou nem perder tempo.". Hoje em dia você vê que já é outra coisa, você que todo mundo aqui tem um trabalho de qualidade. A gente que aconteça isso mesmo, que o Brasil deixe de ser "o mercado de só faz jogo ruim" para se tornar uma potência.

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Estas foram quatro das diversas equipes que conversei durante o evento, em breve lançaremos um post com informações sobre mais equipes (e detalharemos as equipes entrevistadas) indies brasileiras. Confira as equipes entrevistadas:

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*Errata: A VOID STUDIOS está oficialmente no mercado desde fevereiro de 2015.

Última atualização no dia 22 de outubro de 2015 às 23:26.

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